quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

O BRASIL NA BOCA DO POVO.

A influência dos negros na culinária brasileira aparece onde nem imaginávamos, podendo  até desafiar algumas de nossas certezas. Junto com os portugueses e os índios, os escravos ajudaram a fomentar hábitos e pratos que nasceram no Brasil Colônia e permanecem em nossa mesa até hoje.

Quando os primeiros portugueses se mudaram para o Brasil, não encontraram em nossas terras alimentos familiares como o trigo. Havia aqui uma imensa variedade de frutas e tubérculos, mas muitos desses itens, que se transformavam em iguarias nas mãos dos índios, eram estranhos aos olhos e ao paladar dos colonizadores. 
Trazer tudo da terrinha, nem pensar: o transporte de navio era demorado e não havia como conservar bem os alimentos. O jeito era importar alguns itens, mas principalmente adaptar o paladar aos gêneros encontrados no Brasil. No engenho, quem colocava de fato a mão na massa na maioria das vezes eram as escravas – e a comida acabava sofrendo interferência africana no modo de preparar. A farofa, por exemplo, foi criação delas.

 Assim, podemos falar que a influência africana na culinária brasileira atuou em duas frentes: no modo de preparar, temperar e combinar os alimentos e nos ingredientes trazidos do continente africano, pelos colonizadores. Nessa segunda categoria, entra a banana. Originária da Ásia, a banana seguiu rumo à África e foi partindo de lá que chegou aqui. Embora também dispuséssemos de uma variedade nativa, de nome pacova, a fruta é tida pelo antropólogo Câmara Cascudo como a maior contribuição africana à alimentação no Brasil. Enquanto o modo de preparo predominante na cozinha portuguesa era o cozimento, os escravos preferiam assar os alimentos, como os índios.

Nem sempre índios e africanos tinham o mesmo gosto: os primeiros desprezavam o caldo do feijão, que era comido seco, enquanto escravos e portugueses apreciavam uma comida molhada. Como o sal era caro, os africanos habituaram- se a salgar pouco e a caprichar na pimenta. Verduras eram um acompanhamento comum à mesa deles, uma novidade para os portugueses. Couve, quiabo e taioba, entre outros, eram corriqueiras. “Com a europeização da mesa é que o brasileiro tornou-se um abstêmio de vegetais”, escreve Gilberto Freyre em "Casa-Grande e Senzala", entendendo-se por europeização a influência, sobretudo da França, a partir do século XIX.
Outro hábito que os colonizadores estranharam: acompanhar as carnes com frutas. Como Câmara Cascudo nota, os escravos comiam lombo com abacaxi e feijão-preto com laranja. 
Então, é bom lembrar: se a feijoada (foto 2) tem raízes européias, as rodelas de laranja e a couve refogada são obra da influência escrava na culinária brasileira. Não eram apenas o conforto e a quantidade de comida que separavam as refeições feitas na casa-grande e na senzala. Enquanto os colonos tinham o hábito de conversar e tomar algo enquanto comiam, escravos preferiam comer calados, sem beber nada, como a maioria dos orientais. Algumas vezes, deixavam a bebida para o fim.

A conversa à mesa e o hábito da sobremesa também vieram dos portugueses.Falando em doces, é claro que  naqueles tempos,  o açúcar era artigo de luxo. Assim, os doces não eram presenças marcantes no cardápio dos escravos, embora eles dessem um jeito de acrescentar algumas guloseimas à dieta – como a rapadura, a garapa e o melado.
Os deliciosos doces portugueses, ricos em ovos, eram reservados para datas especiais. No dia a dia, as senhoras faziam quitutes para serem vendidos nas ruas, pelas escravas. Desse modo, as negras aprenderam a empregar o açúcar na culinária. Nasciam os doces brasileiros: pé-de-moleque, cocada, pamonha, canjica, mingau, compotas, frutas secas. 
Enquanto isso, doces conhecidos pelos portugueses sofriam algumas modificações locais: é o caso do arroz-doce, feito lá com gemas de ovo e aqui com leite de coco. Sim, o leite de coco nasceu no Brasil por obra dos escravos, que já conheciam bem o coco.
Trata-se de um ingrediente ainda hoje requisitado na nossa culinária – mesmo quem não é íntimo das panelas deve ter reparado que, além de fazer parte de várias receitas, ele rega peixes e incrementa itens que vão de frango a risotos. Ralar o coco também é uma técnica africana, da mesma forma que montar um prato em cima da folha de bananeira ou mexer a bóia com colher de pau. Só há relato do uso de milho nos doces no começo do século XVII.

Embora o grão já fosse conhecido pelos índios, portugueses e escravos, não era  muito valorizado na alimentação e servia mais como ração dos animais. Isso até as portuguesas o incorporarem às receitas: o milho passou a entrar na composição de bolos, pudins, papas, angus e mungunzás eram obra das mãos das negras.

Enfim, nossa culinária já foi muito mais simples e natural. Mas mesmo hoje, em meio a tantas opções, continua sendo delicioso abrir mão do pacotinho de chocolate e dar uma bela colherada em um doce de abóbora, ou se lembrar de que o prosaico pedaço de banana que acompanha um prato de comida tem uma história linda por trás.

(Fonte de pesquisa: vida simples)
Desconheço a autoria das fotos publicadas acima. 

42 comentários:

Carol Liôa disse...

Ola Silvana! Obrigada pelo comentário em meu blog! Adorei o seu, adoro curiosidades, ainda mais do meu pais^^ Bjs

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Silvana, esse seu post me encheu a boca d'água imagina que estou à anos sem comer essas delícias.

Bjao

Taia Assunção disse...

Engraçado é que tanto no Congo quanto na Zâmbia só encontra-se banana prata para comprar, não sei como é nos outros países. Uma única vez encontrei banana da terra em uma feira na Zâmbia. Não há variedade como temos aqui no Brasil. E consomem pouco feijão, normalmente no café da manhã e com massa de tomate. Mas acredito que isso seja influência européia. Beijocas!

Unknown disse...

Muita informação legal aqui.

Como sou "boa boca", adoro toda essa influência de três povos tão diferentes, trouxeram pra nós.
bjs

Vicktor Reis disse...

Querida Silvana

Muito interessante o que contas.

E nas voltas que a vida e as gentes dão é agora a vez de em Portugal "descobrirmos" as excelentes comidinhas brasileiras...

Aqui bem pertinho um amigo meu, com muitos anos passados no Brasil, tem um restaurante cujo nome diz tudo: Sabor Mineiro.
Beijinho.

...Drika disse...

Bom dia, Silvana!
Hummmm vc me fez ficar com vontade de comer uma boa feijoada, ainda mais que o tempinho aqui agora deu uma esfriada =)

Td bem c vc? Seu blog voltou ao normal? No meu blog vc não ta aparecendo ainda...

Bj no coração e fica com Deus!!!

Xanele disse...

Hummm...fogão a lenha q delícia.
Adorei sua visita
Beijo Xan

Anônimo disse...

Ola Silvana hoje vc tocou em um assunto que gosto, adoro saber sobre a cultura culinaria dos paises, que sejem orientais, europeus, africanos ou americanos, acho interesante saber de onde veio isso ou aquilo, se é nativo daqui ou dela, muitas coisas gostosas como vc disse foi graças aos africanos, farofa gosto muito! Pé de mole nem se fala!! É por isso que acho que cada cultura seje ela de onde for é importante mesmo se nao gostarmos de tudo, é legal saber!!!

ps: Morar na serra é bem bacana pois fica proximo do mar e longe do calor! Fez otima escolha, acho que futuramente vou optar por uma escolha parecida rs!

um abraço!

Elizabeth disse...

Oi menina, que aula!
Beijo.

. disse...

Ler este post na hora do almoço sem poder almoçar..ahh não vale..rs
Beijo

Graça Pires disse...

Obrigada pela visita e pelas palavras deixadas no meu "Ortografia". Passarei neste seu in teressante espaço outras vezes.
Um beijo.

A Itinerante - Neiva disse...

Silvana,

Muito interessante seu blog. Importante mesmo esta preservação de nossa história e cultura. Já estou seguindo.

Fui criada à base de doce de banana. rsrs

Beijos

fénix renascida disse...

Pois eu adorava provar o vosso arroz-doce, feito com leite de côco!!! Adoro arroz-doce, e gosto muito de côco, por isso não duvido de que iria apreciar esta vossa forma de o apresentar:P

Vitor Chuva disse...

Olá Silvana!

Hoje a "história" aqui contada para além da habitual qualidade a que já nos habituou, tem um gosto docinho, que sabe muito bem ler.
Qunto aos doces que foram daqui até ao Brasil, o curioso é que também aqui, uma boa parte deles era confeccionada com a finalidade de ser vendida: Neste caso feitos em mosteiros e conventos, por religiosas, criadoras de receitas deliciosas ( conventuais), que ainda hoje fazem para vender em ocasiões especiais.
E quanto ao arroz doce, nem todo aqui é feito com ovos - tal como aí.
A minha mãe sempre o fez só com leite de vaca - num grande tacho em cobre - e ainda hoje é uma dos meus doces favoritos, com uma decoração simples em canela, que lhe acrescenta um sabor requintado!

Poste gostoso, este!

Beijinhos.
Vitor

Regina Rozenbaum disse...

Eiii Sil Amada
Cheguei em hora super propícia: comida. Meu maior pecado é a gula e todo o prazer envolvido ao redor da boa mesa (mineira cê sabe cumé qui é, né?). Aí tá dando prá comer uma boa feijoada? Aqui, amada, só se for prá morrer sem aviso prévio: calor insuportávellllll. Tô derretendo sem ser sorvete rsrs.
Beijuuss n.c.

www.toforatodentro.blogspot.com

A Itinerante - Neiva disse...

Também sou neta de portugueses e filha de mineiros. Doce de tacho!!! Meu Deus!!! Que vontade!!!

Fazíamos muito de abóbora, de leite, de banana. E pamonha, então?

Era uma festa. Juntava um bando de parentes e vizinhos no quintal e na cozinha, debulhando as espigas, ralando, fazendo os saquinhos, enchendo. E as crianças correndo e o tacho imenso em cima de fogueira de verdade mesmo. Bom dimais!!

E porco então? Mesma coisa: monte de gente ajudando a limpar, cortar, cozinhar.

Depois cada um levava uma trouxinha para casa. rsrs

E o restante ficava mergulhado em latas de gordura e pescávamos pedaços durante todo o próximo mês. lol

Ai que saudades deu agora.

Beijos

Maria Arteira disse...

Silvana,
Mais um texto informativo e muito bom. Adorei. Feijoada eu adoro....Como sou neta de português e africano, sei bem as delícias que surgiram entre esses povos, sem falar em outros.
bj

Unknown disse...

Apetitoso todo este post.

Beijos.

εїз ViViAn ★ Sbrussi /(",)\ disse...

       ( ),,( )
       (=':'=)
  ﻶﻉჱﻶﻉ═¤═(,,)♥(,,)═¤═ﻶﻉჱﻶﻉ

Oiiii querida Silvana!
que delícia te receber em meu blog!
e que delícia esse post... hummmm
um ótimo fds!

bjoooo

Rosemildo Sales Furtado disse...

Oi Silvana! Acabei de ler teu post e me deu fome. Vou comer agorinha uma fatia de bolo de milho, mesclado com chocolate qua fiz, Gosto de cozinhar.

Beijos,

Furtado.

Maria Bonfá disse...

amei ler todas essas curiosidades.. e o bom que vc falou de todas as comidas que eu gosto.. muito interessante saber o que existe por tras de tudo o que comemos..parabens por sua ideia ..uma verdadeira aula de cultura..beijão

jurisdrops disse...

Silvana:
Quanto sabor mesclado, quanto conteúdo interessante.
Bjos

Valéria lima disse...

Hummm nossa deu água na boca o post, isso é que é delícia, e agradeço a visita.

BeijooO'

Déia disse...

Quanta coisa boa aprendi!

e QUE FOME QUE ESSE POST ME DEU kkkkkkkkkkk

bjkas

Anônimo disse...

Gente, deu até fome, ler e ver essas imagens, hahahaha. Menina, os negros influenciaram demais na nossa cultura, e em todos os sentidos. Os índios também. O bom disso é que somos europeus, mas com marca registrada. Igual a nós não tem ninguém, rsrsrs. Por isso somos autênticos!
Adorei o post!
SABOROSO!


Beijos e bom findi pra ti.

Guma disse...

Mas que variedade, deliciei-me com esses pormenores e sendo que para mim, comer, é prazer em companhia, foi assim que aqui me senti.
Kandando a atravessar tanto mar, tanto mar...
Excelente fim de semana!

Fátima do Rosário de O. Lima disse...

Oi Silvana. Estou morando na Bahia a 2 meses e estou encantada. Logo após o carnaval encontrei com uma vendedora na praia que tbm era contadora de histórias e lembrei de vc. Coloquei no meu blog de forma simbólica em sua homenagem e tbm na intenção de publicar o trabalho artesanal e talento da bahiana. Abraços!

Vanessa Souza disse...

Silvana, muito bom esse post hein.
Eu trabalho com Turismo Pedagógico e com Melhor Idade em Fazendas, desenvolvendo o Turismo Rural, e com isso, apresentamos vários conceitos, dos que você colocou aqui.
E cá entre nós, me deu uma saudade, por que ultimamente estes eventos, estão parados, por conta das férias.
Resumindo adooorei!

Obrigada pela visita no meu blog, volte mais vezes, e eu, nem preciso dizer que voltarei mais vezes aqui!

Beijos.

Rosa Carioca disse...

Que saudade da paçoquinha!!!!

Maria Auxiliadora de Oliveira Amapola disse...

Boa tarde, Silvana.

Ainda bem, que a nossa maior alquimia, tem como matéria prima, o ser humano.

Um grande abraço.

Lourdes disse...

Silvana
O post de hoje está simplesmente delicioso.
Mais uma aula cheia de curiosidades.
Beijinhos
Lourdes

Zezinha Lins disse...

Olá,amiga, estou precisando da sua ajuda, posso contar com você? Passa lá no meu blog e saberá os detalhes. Bjos!!!!

Lilazdavioleta disse...

Olá Silvana .
Muito obrigada pela sua visita e palavras.

Estou consigo na luta por um mundo melhor .
Teremos que começar pelo Homem , mas quero acreditar que conseguiremos . Com Es-pe.ran-ça .
( um dos vossos poetas que amo )
Um beijo .
Voltarei .
Maria

lino disse...

Extraordinária lição de história da culinária brasileira.
Beijinho

Mariazita disse...

Oi, Silvana
Adorei seu texto.
Quanta informação!
E se é verdade que os portugueses levaram para o Brasil receitas da culinária portuguesa, não é menos certo que, ultimamente, temos sido nós, portugueses, a adoptar a gostosa culinária brasileira.
Isto não admira, pois encontram-se muitíssimos brasileiros na restauração, e têm muito bons restaurantes.

De tanto falar em culinária até já estou com fome... Mas estou a fazerr dieta :(

Bom fim de semana.

Beijinhos
Mariazita

Ofarol disse...

Mais uma lição sobre a cultura brasileira que gostei imenso...

Um beijo

Mariazita disse...

Oi, Silvana
Adorei seu texto.
Quanta informação!
E se é verdade que os portugueses levaram para o Brasil receitas da culinária portuguesa, não é menos certo que, ultimamente, temos sido nós, portugueses, a adoptar a gostosa culinária brasileira.
Isto não admira, pois encontram-se muitíssimos brasileiros na restauração, e têm muito bons restaurantes.

De tanto falar em culinária até já estou com fome... Mas estou a fazerr dieta :(

Bom fim de semana.

Beijinhos
Mariazita

Lídia disse...

É mais que um blog...é uma aula sobre Brasil. Te sigo aqui também. Voltarei, com certeza.
bju no coração.

Daniel Savio disse...

O que importa que a nossa cozinha acabou ficando mais rica...

Fique com Deus, menina Silvana.
Um abraço.

Artes da Marga disse...

Oi Silvana!
Que maravilha ler isso aqui. Muito enriquecedor. Realmente a influência dos negros na nossa culinária é algo inimaginável. Melhor ainda é saber dos toques diferentes que foram sendo incorporados nos pratos trazidos de fora. Quem resiste a uma boa feijoada com raízes européias e se dá conta que as rodelas de laranja e a couve refogada tem influênia escrava na culinária brasileira? E a sobremesa? Cocada, compota de frutas HUMMMM
Bj
Margarida

catwoman disse...

Finalmente consegui entrar, Silvana, e o post não ficou aquém do que eu esperava, pelo contrário,e gostando eu de culinária e de experimentar novos sabores, fiquei de água na boca.
Bjs.

Flora Maria disse...

EXCELENTE !
Adorei a "aula de culinária".
Quanta coisa interessante que ignoramos, e que faz parte do nosso dia-a-dia.

Parabéns !!!
Beijo