sábado, 31 de outubro de 2009

HISTÓRIAS DE TRANCOSO.


Tudo começou com o escritor português de nome Gonçalo Fernandes Trancoso
após publicar o livro "Contos e Histórias de Exemplo", em Portugal no

éculo XVI.Este livro foi editado pela primeira vez no ano de 1575, passou a ser uma
referência nos contos populares.
A expressão "histórias de Trancoso" é muito comum em Portugal e no Brasil,
passando a denominar todo conjunto de histórias populares transmitidas pela
tradição oral.

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QUEM TE MATOU ?

Um homem, certo dia, saiu da cidade andando a pé, e junto a uma porteira, longe de habitações, deu com uma caveira feia como só podem ser a morte e o pecado.

Levianamente, deu-lhe um pontapé e caçoou:

- Quem te matou, caveira?

Mas qual não foi o seu espanto, quando, com um estalar dos ossos muito brancos, lavados de chuva e estorricados ao sol, a caveira respondeu:

- Foi a língua.

O pavor o sacudiu com ímpeto. Saiu por ali afora numa doida carreira, e dentro de pouco tempo estava novamente na cidade. Na sua excitação, contou a toda gente o que lhe acontecera.

- Não pode ser - diziam.

- Foi. Juro. Eu vi. Eu ouvi. Junto a uma porteira.

- Uma caveira falando? Alucinação, meu amigo.

- Verdade.

Alguns acreditavam, outros não. A maioria, não. Mas a notícia correu a cidade, cercou-a, voou até o palácio do rei.

O rei mandou chamar o moço.

- Que história é essa?

O moço contou tudo, ainda se arrepiando de se lembrar do susto.

- Ela respondeu, juro, majestade.

O rei se desencostou do trono e, com um dedo em riste, sacudindo-o diante do nariz do moço, falou:

- Vou lá ver isso. Sou curioso. Mas veja lá, se for mentira sua, e você me fizer bancar o bobo, eu te mando pendurar na primeira árvore que encontrarmos.

- Foi verdade, majestade - murmurou o moço.

Aprestara, então, um grande cortejo. Ia adiante o rei no seu cavalo branco, ricamente ajaezado, com aperos de ouro e prata. E depois, os nobres, suntuosamente vestidos. E os soldados. Tudo aquilo fulgia ao sol. Bem adiante, caminhava o moço a pé, com as mãos amarradas. Tudo estacou junto à porteira. Parecia uma festa. Os que riam e caçoavam calaram-se ao ver a caveira, tão maligna parecia. Trêmulo, o moço perguntou:

- Quem te matou, caveira?

A caveira quieta estava e quieta ficou.

O moço pensou que talvez tivesse falado muito baixo. Em voz mais alta, mas insegura, interpelou novamente:

- Quem te matou, caveira?

E a caveira, quieta.

- Quem te matou, caveira? - gritava agora, com os olhos esbugalhados, saltadas as veias do pescoço, e um pavor infinito apertando-lhe o coração.

- Quem te matou, caveira? Quem te matou, caveira?

E a caveira muito branca, luzindo ao sol, em silêncio. O moço perdeu a cabeça, começou a dar-lhe pontapés, o golpe soava cavo, e ele ia atrás dela novamente, de um para outro lado, suando, rugindo.

- Quem te matou, caveira?

Apanharam-no, veio o carrasco no seu camisolão vermelho, fez o nó corrediço com dedos ágeis, e o moço ficou enforcado numa árvore à beira do caminho, enquanto a comitiva voltava, aparatosa mas sem animação, para a cidade.

Ficou tudo em silêncio, no campo. Não passava viva alma. Decorreram as horas quentes do dia, anoiteceu. Quando se adensaram as primeiras sombras, aconteceu uma coisa extraordinária. A caveira, que não parecia dotada de movimento, rolou um pouco sobre si mesma e veio, aos pulos. Pulou até chegar sob a árvore onde estava o enforcado. E ali, com o feio buraco das órbitas vazias virado para cima, perguntou:

- Eu não te falei que quem te matou foi a língua?




(In ROMERO, Sílvio. Folclore brasileiro; contos populares do Brasil)



sexta-feira, 30 de outubro de 2009

QUEM TEM MEDO DO CURUPIRA ?


Entre os mitos indígenas, o Curupira é incontestavelmente o mais antigo, companheiro inseparável das crenças populares, de onde se admite a possibilidade de ser verdadeiramente indígena, senão antes legado pela população primitiva que habitou o Brasil no período pré-colombiano e que descendia dos invasores asiáticos.
Curupira, de “curu”, abreviação de “curumim” e “pora”, corpo ou corpo de menino. É a “Mãe do Mato”, o tutor da floresta, que se torna benéfico ou maléfico aos freqüentadores desta, segundo as circunstâncias e o seu procedimento.
Ele possui várias formas apresentando-se através de uma figura de um menino de cabelos vermelhos, peludo, com a particularidade de ter os pés virados para trás, pode Ter os dentes azuis ou verdes e é orelhudo. Todos lhe celebraram as manifestações como guardião das florestas. Para crença em geral, ele o Senhor, a Mãe, o Guardião das florestas e da caça, que castiga a todo aquele que a destrói, premiando a aqueles que não o contrariam no seu desejo de manter a mata viva, e também para aqueles que se mostram solícitos e obedientes.
O Curupira, ora é imperioso e brutal, ora é delicado e compassivo, ora não admite desrespeito ou desobediência, ora se deixa iludir como uma criança. Segundo uma crença generalizada, é o responsável pelos estrondos da floresta.
Assim, quando no meio da mata se ouve um estrondo, que não seja uma trovoada, pode estar certo que o Curupira anda por ali… Sob sua guarda direta está a caça que protege, mas entende o caçador e é sempre propício ao homem que mate de acordo com suas necessidades, ou seja, para matar a fome dos seus filhos.
Mostra-se extremamente hostil ao caçador que persegue e mata as fêmeas quando prenhas ou cause danos aos filhotes. Para estes o curupira vira uma fera e um é inimigo terrível. Consegue iludi-los sob a feição de caça, levando-os longe…
Também é capaz de imitar a voz humana para atrair os caçadores, fazendo-os com que se percam dentro da floresta deixando-os no mato abandonados à fome e ao desamparo. Além de ser protetor dos animais, o Curupira é considerado o Senhor das Árvores.
Ele cuida de todas, protege as mudinhas, admira as grandes e bela árvores da floresta. Dizem que armado com um casco de jabuti, bate nas árvores para ver se conservam-se fortes para resistir as tempestades.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A ÁRVORE DE TODOS OS FRUTOS.

Nas terras de Roraima havia uma montanha muito alta onde um lago cristalino era expectador do triste amor entre o Sol e a Lua. Por motivos óbvios, nunca os dois apaixonados conseguiam se encontrar para vivenciar aquele amor.
Quando o Sol subia no horizonte, a lua já descia para se pôr. E vice-versa. Por milhões e milhões de anos foi assim.
Até que um dia, a natureza preparou um eclipse para que os dois se encontrassem finalmente.
O plano deu certo. A Lua e o Sol se cruzaram no céu. As franjas de luz do sol ao redor da lua se espelharam nas águas do lago cristalino da montanha e fecundaram suas águas fazendo nascer Macunaíma, o alegre curumim do Monte Roraima.
Com o passar do tempo, Macunaíma cresceu e se transformou num guerreiro entre os índios Macuxi.
Bem próximo do Monte Roraima havia uma árvore chamada de "Árvore de Todos os Frutos" porque dela brotavam ao mesmo tempo bananas, abacaxis, tucumãs, açaís e todas as outras deliciosas frutas que existem. Apenas Macunaíma tinha autoridade para colher as frutas e dividi-las entre os seus de forma igualitária.
Mas nem tudo poderia ser tão perfeito. Passadas algumas luas, a ambição e a inveja tomariam conta de alguns corações na tribo. Alguns índios mais afoitos subiram na árvore, derrubaram-lhe todos os frutos e quebraram vários galhos para plantar e fazer nascer mais árvores iguais àquela.
A grande "Árvore de Todos os Frutos" morreu e Macunaíma teve de castigar os culpados.
O herói lançou fogo sobre toda a floresta e fez com que as árvores virassem pedra. A tribo entrou em caos e seus habitantes tiveram que fugir.
Conta-se que, até hoje, o espírito de Macunaíma vive no Monte Roraima a chorar pela morte da "Árvore de todos os frutos".

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

AS AMAZONAS.


Na Antiga Grécia, bem antes da vinda de Cristo a Terra, eram narradas histórias sobre mulheres que andavam a cavalo, manipulavam o arco e a flecha com rara habilidade e se recusavam a viver com os homens em seus territórios. Estas exímias guerreiras eram conhecidas como Amazonas, das quais nem os mais destemidos soldados poderiam fugir com vida.

Em 1540, o aventureiro hispânico Francisco Orellana, escrivão da armada espanhola, participou de uma jornada exploratória na América do Sul, atravessando, portanto, o extenso e misterioso rio que cruzava uma das mais temidas florestas. Segundo "A Lenda das Amazonas", ele teria avistado, no pretenso reino das Pedras Verdes, mulheres semelhantes às acima descritas, conhecidas pelos indígenas como Icamiabas, expressão que tinha o sentido de ‘mulheres sem marido’.

Contam os índios que estas guerreiras teriam atacado a esquadra hispânica. Elas eram bem altas, brancas, cabelos compridos dispostos em tranças dobradas no topo da cabeça – descrição feita pelo Frei Gaspar de Carnival, também escrivão da frota.

O confronto entre os espanhóis e as Amazonas foi supostamente uma luta feroz, a qual teve como cenário a foz do rio Nhamundá – localizada na fronteira entre o Pará e o Amazonas. Os europeus foram surpreendidos pelo ataque de inúmeras e belas combatentes desnudas, conduzindo tão somente em suas mãos arcos e flechas. Eles foram assim prontamente derrotados pelas mulheres, pondo-se rapidamente em fuga.

No caminho os espanhóis encontraram um indígena, que lhes contou a história das guerreiras. Segundo o relato do nativo, havia pelo menos setenta tribos de Icamiabas só naquele território. Suas aldeias eram edificadas com pedras, conectadas aos povoados por caminhos que elas cercavam de ponta a ponta, cobrando uma espécie de pedágio dos que atravessavam estas estradas. Elas eram lideradas por uma cunhã virgem, sem contato com o sexo masculino.

Quando, porém, chegava o período de reprodução, as Amazonas capturavam índios de tribos por elas subjugadas. Ao engravidar, sinalizavam seus parceiros e, se nascia um curumim ou menino, elas entregavam a criança aos pais; do contrário, elas ficavam com as meninas e presenteavam o genitor com um talismã verde conhecido como Muiraquitã, similar ao sapo utilizado nos rituais lunares.

Ao ouvirem esta narrativa, os espanhóis, cientes da existência das Amazonas descritas pelos antigos gregos, confundem ambas e batizam o rio onde as encontraram, até então intitulado Mar Dulce, de Rio de Las Amazonas.

Certamente os espanhóis, ao se depararem com selvagens guerreiros de longos cabelos, acreditaram ter encontrado finalmente as tão famosas Amazonas. Deste pequeno equívoco nasceram e permaneceram os nomes do Rio, da Floresta e do maior Estado brasileiro, que abriga o idílico cenário desta miragem hispânica. 
Embora esta história tenha se desenrolado em terras brasileiras, estas lendas são mais disseminadas em outros países, talvez pela associação com narrativas que envolvem ícones adornados com ouro e prata, o que certamente despertava a cobiça dos europeus. 






                                      Saudações Florestais !

terça-feira, 27 de outubro de 2009

A LOIRA DO BANHEIRO.

Lendas urbanas, mitos urbanos ou lendas contemporâneas são pequenas histórias de caráter fabuloso ou sensacionalista, amplamente divulgadas de forma oral, por e-mails ou pela imprensa e que constituem um tipo de cultura moderna. 
São frequentemente narradas como sendo fatos acontecidos a um "amigo de um amigo" ou de conhecimento público.

Muitas delas já são bastante antigas, tendo sofrido apenas pequenas alterações ao longo dos anos. Muitas foram mesmo traduzidas e incorporadas a outras culturas. É o caso de, por exemplo, a história da loira do banheiro, lenda urbana brasileira que fala sobre o fantasma de uma garota jovem de pele muito branca e cabelos loiros que costuma ser avistada em banheiros, local onde teria se suicidado ou, em outras versões, sido assassinada.

Outras dessas histórias têm origem mais recente, como as que dão conta de homens seduzidos e drogados em espaços de diversão noturna que, ao acordarem no dia seguinte, descobrem que tiveram um de seus rins cirurgicamente extraído por uma quadrilha especializada na venda de órgãos humanos para transplante.

Muitas das lendas urbanas são, em sua origem, baseadas em fatos reais (ou preocupações legítimas), mas geralmente acabam distorcidas ao longo do tempo.

Suas características principais seriam:

* Uma forma narrativa (geralmente uma pequena história, porém bem estruturada)

* Procura sempre se autenticar por meio de testemunhas e provas supostamente existentes

* As pessoas que as contam geralmente às ouviram de alguém e quando repassam a história costumam confirmá-la como se tivesse sido vivida por ela mesma

Com o advento da Internet, muitas lendas passaram a ecoar de maneira tão intensa que se tornaram praticamente universais.


A loira do banheiro é muito famosa entre os alunos de escolas da rede pública na cidade do Rio de Janeiro.
Conta a lenda que uma garota muito bonita de cabelos loiros com aproximadamente 15 anos, sempre planejava maneiras de matar aula. Uma delas era ficar no banheiro da escola esperando o tempo passar.
No entanto um dia, um acidente terrível aconteceu: a loira escorregou no piso molhado do banheiro e bateu sua cabeça no chão. Ficou em coma e pouco tempo depois veio a falecer.
No fim de tudo isso, a menina não se conformou com seu fim trágico e prematuro, sua alma não quis descansar em paz e passou a assombrar os banheiros das escolas.
Muitos alunos juram ter visto a famosa loira do banheiro, pálida e com algodão no nariz para evitar que o sangue escorra. A loira do banheiro é uma história brasileira muito contada nas escolas públicas.
Muitos alunos juram que viram a loira do banheiro. Ela têm pedaços de algodão no nariz para evitar que ele sangre.
Mas cuidado, nunca aperte a descarga por três vezes e nem chute o vaso sanitário com força, pois pode ter uma loira a sua espera, pronta para te atacar. 
Para a Loira do Banheiro, aparecer bastava simplesmente realizar esse ritual para que a horripilante, fantasmagórica e sangrenta aparecesse.

Saudações Florestais !

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

A LENDA DO SOL.


Para os índios o Sol era gente e se chamava KUANDÚ.

Kuandú tem três filhos: um é o sol que aparece na seca; o outro, mais novo, sai

na chuva e o filho do meio ajuda os outros dois quando estão cansados.

Há muito tempo um índio Juruna teria comido o pai de KUANDÚ.
Por isso este queria se vingar. Uma vez Kuandú estava bravo e foi para o mato pegar coco.
Lá encontrou Juruna em uma palmeira inajá. Kuandú disse que ele ia morrer, mas Juruna foi mais rápido acertando Kuandú com um cacho na cabeça.
Aí tudo escureceu. As crianças começaram a morrer de fome porque Juruna não podia trabalhar na roça e nem pescar. Estava tudo escuro.
A mulher de Kuandú mandou o filho sair de casa e ficou claro de novo.
Mas só um pouco porque era muito quente para ele.
O filho não aguentou e voltou para casa. Escureceu de novo.
E assim ficaram os 3 filhos de Kuandú, entrando e saindo de casa.
Portanto, quando é seca e sol forte é o filho mais velho que está fora de casa. Quando é sol mais fraco é o filho mais novo.
O filho do meio só aparece quando os irmãos ficam cansados.


domingo, 25 de outubro de 2009

A LENDA DO BEIJA-FLOR.


Existiam duas tribos morando à beira de um rio: uma tribo maior e uma tribo menor.

A tribo menor plantava e pescava com muito afinco e, com isso,começou a ter mais peixe e maior abundância de alimentos. Isto gerou inveja na outra tribo, que começou a hostilizar seus vizinhos, primeiro com palavras, depois com gestos e por fim declararam guerra àqueles que, mesmo em menor número, eram mais trabalhadores e eficientes.
Indiferente a estas questões, dois jovens se enamoraram, porém cada qual pertencia a uma tribo. O rapaz pertencia à tribo menor e a jovem à tribo maior. Apesar da guerra, os dois se encontravam às escondidas, mas um dia os guerreiros da tribo da jovem a seguiram e os encontraram namorando. Depois de espancar o rapaz e pensando que ele já estivesse morto levaram a jovem de volta à tribo.

O Conselho dos Anciãos foi convocado para o julgamento da pobre jovem. A acusação era de traição, já que as tribos estavam em guerra e eles acreditavam que ela passava segredos para a outra tribo. A sentença era de morte, mas por ela ser muito jovem e bela, convocaram o Pajé que resolveram transformá-la numa flor.
O rapaz, socorrido por seus guerreiros, sobreviveu ao espancamento e, tão logo se recuperou passou a procurar desesperadamente pela sua amada. Ele chamou os anciãos e anunciou que iria até a outra tribo em busca de seu amor. Eles não permitiram tremenda loucura e tentaram, de toda forma, impedi-lo.
Afirmaram que na sua tribo existiam lindas moças que poderiam ser boa esposa e dar-lhe filhos fortes e saudáveis. O rapaz estava irredutível e os anciãos, vendo tamanha decisão e tristeza do jovem, chamaram o pajé para ajudá-los. Depois de muito pensar e sabendo que a jovem amada tinha sido transformada em flor decidiram transformá-lo em Beija-Flor.

E por isto que o Beija-Flor vai de flor em flor, sempre tentando achar a sua amada.

sábado, 24 de outubro de 2009

O BOTO ROSA.

Na mitologia Amazônica, encontramos o Boto Rosa, que tem o poder de emergir das águas do rio a noite, e se transformar num belo homem, para seduzir as muheres que se sentem atraídas pelo seu estranho fascínio. Apresenta-se sempre de terno rosa ou branco e traz um chapéu também rosa ou branco para ocultar os orifícios que estão em sua cabeça e pelos quais respira.

A lenda do boto rosa está ligada aos ribeirinhos, às festas juninas, aos bailes caseiros e populares, quando então, todos se encontram para as festividades e as moças colocam seus trajes mais bonitos, se enfeitam e aproveitam para namorar, enquanto seus pais conversam distraídos e alheios a tudo.
Nessas noites, geralmente de luar, o Boto aparece em forma de um homem alto, bonito, com um chapelão na cabeça.
Gentil e cavalheiro, todas as moças ficam encantadas e se deixam levar por sua beleza. E ele então, escolhe a mais bonita e a leva para a praia ou a beira do rio.
E ali, tece e acontece. E amor vinga de uma maneira, simples e direta, mas cheia de encanto e magia. Só que depois, some e nunca mais é visto pelas redondezas e a garota carrega no ventre o fruto de uma noite de encantamento sem no entanto mostrar-se arrependida do ato consumado.
Dizem que, geralmente nasce um menino, o filho do Boto.

Tela: Boto Rosa - Lenda da Amazônia
Artista: Regiane Bassani

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A LENDA DO AÇAI.

O açaí, fruto do açaizeiro, palmeira comum na Amazônia, é conhecido pelos indígenas como “iça-iça”, a fruta que chora.
Reza a lenda que num passado distante vivia na região de Belém do Pará, ainda não fundada, uma tribo indígena numerosa que sofria com escassez de alimentos, e por isso muitos de seus membros passavam fome quase diariamente.
Preocupado com esta situação e reconhecendo que o problema precisava ser resolvido de vez, o cacique Itaki se viu forçado a adotar uma medida cruel: para evitar o aumento da população tribal, daquele dia em diante todas as crianças que nascessem na aldeia seriam sacrificadas.
E assim foi feito, o mesmo acontecendo com Iaçã, filha do cacique, que deu à luz a uma bela menina, que acabou sendo morta porque essa era a lei.
A jovem mãe ficou desesperada com a perda de sua filha, e todas as noites ela chorava desolada em sua cabana, pedindo que o deus Tupã mostrasse a seu pai um outro caminho que pudesse impedir o sacrifício de tantos recém-nascidos.
Certa noite a índia ouviu um choro de criança e ao sair de sua morada, avistou sua filha junto a uma palmeira. Por um momento ela ficou paralisada, não acreditando no que estava vendo. Mas logo depois, correu em direção à menina, pretendendo abraçá-la com toda ternura e saudade que guardava no coração. Porém sua filha desapareceu ao aproximar-se da mesma forma que acontece com a fumaça na ventania e por causa desse susto, Iaçã desfaleceu.
Quando o dia amanheceu e o sol raiou, seu corpo foi encontrado abraçado ao tronco da palmeira, trazendo no rosto um sorriso de felicidade, com os olhos voltados para os frutos escuros presentes no alto da planta.
Por ordem do cacique Iraki, os frutos da palmeira foram colhidos e com eles se fez um vinho vermelho batizado com o nome de açaí ( Iaçã invertido ) para homenagear a sua filha.
Como a fruta serviu para alimentar satisfatoriamente toda sua tribo, o cacique decidiu que, a partir daquele dia, sua ordem de sacrificar as crianças estava suspensa.

Saudações Florestais !

terça-feira, 20 de outubro de 2009

BEM VINDO A ILHA DE PAQUETÁ.



A Ilha de Paquetá no Rio de Janeiro destaca-se desde os fins do século XIX, como um dos locais mais românticos do país, onde grandes amores tiveram início.
Essa associação do lugar ao culto a "Eros" se deve, em grande parte, ao fato de que no imaginário popular o romance "A Moreninha", de Joaquim Manoel de Macedo, teve como cenário a Ilha.
Entre as diversas lendas de Paquetá, a mais famosa e que influenciou bastante na ocupação humana da Ilha foi, sem sombra de dúvida, a lenda da Moreninha, escrita por Joaquim Manoel de Macedo em 1844.
Segundo algumas pessoas, o amor entre Augusto e Carolina ocorreu na Ilha de Paquetá, e o autor teria escrito o romance na própria Ilha, numa pensão situada a Rua Padre Juvenal nº 44, que pertencera a Sra. Maria da Cunha Marques e seu esposo. Atualmente, pertence por herança a um de seus filhos. O prédio onde funcionava a velha pensão foi tombado muito antes do tombamento da Ilha. Há quem afirme que Augusto era o nome sob o qual se escondia Joaquim Manoel de Macedo, talvez para ocultar a história real acontecida com ele.


Outra lenda famosa é a do "Poço de São Roque". O culto a São Roque vem desde os tempos coloniais. D. João VI e D. Pedro I freqüentemente vinham à Ilha participar da festa do santo padroeiro. No Poço de São Roque foi realizada a primeira festa das árvores e segundo diziam, possui uma água milagrosa capaz de curar feridas quando lavadas e solucionar doenças quando ingerida em doses fracionadas.
As romarias eram grandes, vindo pessoas de diversos lugares. 
Afirma-se, inclusive, que D. João VI banhou nas águas do poço uma úlcera na perna ficando curado da mesma.
  Existe também uma outra lenda a respeito do poço de São Roque: "quem beber daquela água voltaria certamente à Ilha e encontraria nela um amor paquetaense, pelo qual ficaria preso à Ilha para sempre".



Outra narrativa bastante difundida é a da "Pedra dos Namorados": ela afirma que se um casal arremessar algum objeto e este ficar sobre a pedra, o casamento se dará em curto espaço de tempo e o amor será eterno. Até hoje essa lenda atrai milhares de casais de namorados.
Outra história bastante intrigante é esta que trago para vocês - A Lenda da Pedra Rachada. 


Em frente ao “farol vermelho” bem na Baía de Guanabara, quase chegando a Ilha de Paquetá, existe um recife majestoso
secionado ao meio. Contavam os velhos da terra:

-“Dois irmãos, uma índia e um índio, que habitavam aquele local antes da chegada dos europeus, tiveram amores incestuosos.
Certa vez, quando praticavam o pecado,
um raio caiu sobre eles, separando-os e transformando-os naquelas duas rochas".

Eu tive a felicidade de ser criada nesta ilha, cujas narrativas misteriosas povoaram o meu imaginário desde criança.

Saudações Florestais !

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A GRUTA DOS AMORES.


Eu tive o privilégio de ter uma avó contadora de histórias. Dessa forma eu criei os meus filhos e pretendo também, contar para os meus netos quando os tiver.
 Esta é uma de suas muitas histórias contada todos os anos que ia passar as férias escolares na Ilha de Paquetá. Sim, eu fui criada nesta iilha cheia de mistérios e lendas...
 
Tudo começou no tempo dos índios Tamoios. 
Itanhantã ia em sua canoa pescar e caçar na Ilha de Paquetá, na Baía de Guanabara. 
Depois costumava repousava na sombra acolhedora de uma gruta.
Uma indiazinha, chamada Poranga, ia diariamente apanhar caça para Itanhantã - mas ele não dava a mínima pelota para ela! 
Todos os dias Poranga subia na pedra da gruta e cantava, esperando Itanhantã chegar, pescar, caçar e descansar. E todos os dias suas lágrimas caíam na pedra.
O canto e o choro de Poranga não amoleceram o coração de Itanhantã, mas suas lágrimas conseguiram abrir um buraco na pedra até que, certo dia, caíram sobre os olhos do caçador adormecido. 
Assustado, saiu correndo para a sua ubá.Quando avistou Poranga e disse:
 -"Cunhã-Porã", que quer dizer "moça linda".
No dia seguinte, ao voltar ao seu local de descanso, Itanhantã prestou atenção na linda voz da indiazinha e apaixonou-se por ela. Os dois foram felizes pelo resto de suas vidas. 
E as lágrimas de Poranga se transformaram na fonte de água que existe até hoje na Gruta dos Amores. 
Diz a lenda que quem quiser encontrar um amor para a vida inteira, basta tomar uma gota da água da fonte da Gruta dos Amores. 
 
Bem, verdadeira ou não, eu bebi da água e escontrei e o meu amor para a vida inteira.

domingo, 18 de outubro de 2009

A PONTE DA SAUDADE ( ILHA DE PAQUETÁ ).


“Tudo aconteceu no tempo em que os escravos desembarcavam neste cais, vindos de Brocoió, onde faziam quarentena, antes de entrar em contato com a população da Ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro. Por esse fato é que o cenário desta estória teve como palco este lugar.
Seu personagem principal foi um preto forte e triste, chamado pelos negros de João Saudade e, pelos feitores, de João da Nação Benguella. Seu nome criou fama nas senzalas onde, na prosa dos mais velhos, foi um mito, falado e venerado por toda a gente escrava.
João da Naçao Benguella, no tempo do mil réis, foi vendido aqui por 400$000, avaliados pela força e robustez da exuberância muscular do seu contorno.
Dizem que veio da África num dos navios negreiros de Francisco Gonçalves da Fonseca, o dono do “Solar Del’Rei”. 
Como era de costume, depois da quarentena em Brocoió, veio para ca numa falua, que uma vez por mês encostava neste cais da “Praia das Pedreiras”.
João obedeceu com resignação ao costumeiro ritual; porque em seu peito não havia lugar – nem para ódios, nem para revoltas – porque já estava todo cheio de um outro sentimento: a enorme saudade que lhe fazia sofrer por Januária, e lhe fazia viver pelo amor de Loreano, um pretinho rechonchudo; filho deles dois.
João Saudade não podia imaginar o que fora feito deles. Quando foi capturado, não houve tempo nem para um abraço, nem para um “adeus”!
Os anos passavam lentos e João passava os anos rezando pelo amor dos dois. No íntimo de si havia uma certeza estranha… uma esperança, que a falange de Iemanjá, que o trouxera sobre as ondas, também traria seus dois amores que, um dia, ele veria chegar naquela “ponte”, depois de alguma quarentena em Brocoió. Algo lhe dizia que o destino lhe havia reservado um reencontro… e era por ele, que rezava aos guias e esperava ali a cada desembarque.
Passaram-se os anos. E cada ano que passava era mais longo… mas nenhum, maior que a perseverança de João “Benguella”.
Durante o dia, trabalhava nas caieiras; e à noite, rezava junto ao cais, conversava com a Lua, falava com as estrelas, molhava os pés cansados nas águas amenas deste mar, e lavava as suas mágoas nas gotas de sereno. Somente quando ouvia o pio das primeiras aves despertadas é que parava de falar com a Estrela Dalva. Olhava para o céu, despedia-se da noite já passada; dava um bom dia para a madrugada e voltava… devagar e triste, para as tristezas da senzala.
Todos os dias João chegava, cabisbaixo… cansado de rezar em vão, por encontrar um lenitivo para a dor desta saudade que, amargurando a sua alma, minava a resistência do seu coração, transbordando-lhe nos olhos refletida em cada lágrima.
João não era apenas um escravo triste. Para alguns dos velhos, era a própria encarnação humana da saudade.
O tempo passava como de costume, no correr dos anos: João, sua Saudade, os desembarques, o velho cais… Mas eis que um dia, João não regressou com os passarinhos… e os escravos, na senzala, deram falta dele e, em vão, o procuraram.
O desaparecimento de João Saudade aconteceu na manhã seguinte de uma sexta- feira em que a rotina da noite foi quebrada por um fato de espanto e de mistério: – talvez por dois minutos, um clarão estranho transformou a noite em dia, sem que ninguém soubesse explicar por que! Apenas viram surgir no Céu uma estrela muito grande e muito bela, e os seus raios de luz, iluminando a noite, encheram a “Ponte da Saudade” de um clarão de prata, que foi visto por todos na senzala. Quando o clarão se apagou, João Saudade, que rezava no cais, havia desaparecido juntamente com a estrela brilhante e os seus raios de luz.
Ninguém, jamais, soube explicar o que aconteceu à estrela e a João Saudade que, desde aquela noite desapareceu misteriosamente.
Tornou-se crença dos escravos que aquela estrela foi a falange iluminada de Iemanjá que, pela força da Saudade de João “Benguella”, teve permissão do Astral para buscá-lo, pondo fim ao sofrimento do seu Banzo; saudade imensa pela qual viveu, e pela qual sempre pediu para ir embora.
O cais onde João ficava passou a ser chamado de “A Ponte da Saudade”, transformando-se em local de reza e ritual dos negros, na esperança de que um dia também, pela força da Fé, fossem levados por alguma estrela… e libertados”.

sábado, 17 de outubro de 2009

A ÁRVORE GRÁVIDA.


Dando uma espiada no programa Fantástico da Rede Globo de Televisão domingo passado (11/10), deparei-me com um causo  deveras intrigante: a história de uma árvore grávida.

Isso mereceu uma  investigação, e como não sou fraca, fui correndo até o local indicado pela reportagem para conferir o ocorrido.
E não é que a danada da árvore está grávida mesmo?
Bem, eu conto. Foi assim...

O episódio se passa em Nova Iguaçu, região metropolitana do Rio de Janeiro, no bairro Rodilândia.  Quando lá cheguei, para minha surpresa descobri que além de todos conhecerem a história da mulher grávida  assassinada e enterrada pelo marido ciumento, em cima da qual cresceu uma árvore com todas as formas da gestante, a população local tinha pavor de passar pela Estrada de Ferro a noitinha.
Dizem que se alguém passa na rua durante a noite arrastando os pés,  rindo ou fazendo qualquer tipo de arruaça, a tal árvore  atira terra em cima de quem estiver perturbando o seu sono.
Há pouco tempo, uma moradora do bairro saiu de casa por volta da meia noite para arriar uma obrigação  na tal árvore e nunca mais foi vista. A vizinhança garante que ela foi engolida pelo vegetal. Pelo sim, pelo não, é bom tomar muito cuidado ao transitar lá pelos lados Estrada de Ferro após a meia noite, nunca se sabe: cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.

Verdade !

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

"A PEDRA DO FRADE E DA FREIRA:" A LENDA DO AMOR IMPOSSÍVEL.


A "Pedra do Frade e da Freira" é uma belíssima formação rochosa localizada entre os municípios de Cachoeiro de Itapemirim e Rio Novo do Sul, região sul do estado do Espírito Santo.
Sobre esta formação granítica conta-se uma lenda bastante curiosa, passada de geração para geração, sobre  um frade que se apaixonou por uma freira que com ele trabalhava na cristianização dos povos nativos da região, e que devido as circunstâncias, acabou sendo correspondido.
Diante do fato e do sofrimento de ambos, divididos entre o celibato e o amor, Deus decidiu eternizar esse sentimento transformando-os em pedra.

Quando o Brasil engatinhava na sua tragetória, chegaram aqui os semeadores da fé, pois a história nos conta que há mais de 400 anos os frades andavam pela região sul do estado em busca de ouro e de almas, o que acabou dando credibilidade à lenda .
Com o passar dos anos, esse amor foi registrada nos versos do poeta  Benjamim Silva (1886 - 1954 ) com o soneto "O Frade e a Freira":

    Na atitude piedosa de quem reza,
      e como que num hábito embuçado,
   pôs, naquele recanto,  a natureza

a figura de um frade recurvado.
           E sob  um negro manto de tristeza
               vê-se uma freira , tímida ao seu lado,
           que vive ali rezando, com certeza,
           uma oração de amor e de pecado.
   Diz a lenda - uma lenda que espalharam - 

que aqui, dentrte os antigos habitantes,
      houve um frade e uma freira que se amara

Mas que Deus perdoou lá do infinito,
         E eternizou o amor dos dois amantes
        Nessas duas montanhas de granito.



Às margens do Itapemirim, sobre os fundamentos de granito, ergueu-se o casal, confabulando juras de amor, ouvidas pelas tempestades e compreendidas pelos passarinhos. Deus não os separou, nem os uniu, mas os deixou devidamente próximos em atitude de reza, frente a frente.

E assim permanecerão para sempre..


.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

HOMENAGEM AO DIA DO PROFESSOR.

Hoje é um dia especial, é o DIA DO PROFESSOR. E para festejar em grande estilo, eu trago um texto igualmente especial, a altura deste dia e escrito por um professor.
É uma das muitas coisas belas que pude contemplar até os dias de hoje, por isso divido com quem já conhece e com quem não conhece.
 Boa leitura.
....................................

                                               OUVIR HISTÓRIAS...
                                               LER O MUNDO...

 -  Bartolomeu Campos de Queirós -

(Professor, escritor e autor de obras de literatura e livros didáticos, tendo sido agraciado com muitos prêmios e condecorações).

O mundo é um livro sem texto, criado a partir da palavra. Dizendo  faça-se a luz, a água, a terra, o caos se curou.  Livro sem texto onde me vejo elaborando orações, apaziguando as imensas emoções percebidas nesse mar de linhas e horizontes de eternas leituras. Desde o início em que me lembro, leio ininterruptamente suas páginas, recorrendo a todos os meus sentidos, acrescentando ainda o fantasiado, na tentativa de me acalentar frente a tão imenso mistério. E sobre esse remoto livro sem texto – invenção original primeira – busco atribuir significado a tudo que ultrapassa o meu pouco poder. Freqüentemente, incapaz de decifrar os enigmas, recorro aos imaginário, resgatando elementos para me proteger diante de tamanha intensidade. E só a palavra me inscreve.
Se me vejo criança, perto do nascimento,me sei mais assustado. Nascer foi receber, sem aviso prévio e de uma só vez, todo um livro onde o firmamento está ilustrado com estrela, sol, lua, vôos, caprichosamente equilibrados em via-láctea, constelações, caminho de São Tiago e os anjos. As terras, essas decoradas com árvores, frutos, estações, pedras e os homens. O fundo das águas povoado de corais, peixes, jardins, conchas e os narcisos. E se não fossem as palavras, aos poucos a mim presenteadas, eu teria sofrido da ansiedade que suponho ter vivido o primeiro homem ao se ver abandonado e obrigado a nomear cada coisa pela primeira vez, pois não existe pensamento sem palavra e refletir, para vencer no mundo, foi tarefa maior de Adão.
Assim, procurando adivinhar esse livro sem texto, eu escutava o conto de cada um, com o intuito de facilitar a minha leitura. Cada história me trazia novos entendimentos e outras lembranças. Elas clareavam meus jovens pressupostos, me revelavam o sentido que cada um imprimia a essa viagem.
E muitos – avós, padrinhos, vizinhos – me ofereciam histórias. Em suas narrativas afetuosas eu descobria o contraditório, o medo, o desejo, o ódio, a insegurança, sentimentos comuns a todos nós, passageiros.  Revelou-se para mim que contar histórias era, também para eles, colocar as dúvidas, temporariamente, em seus lugares. Isso nos aproximava. O contador se fazia ouvinte de si mesmo. E todos, com diferentes lápis e vários tons, legendavam as páginas do livro. Receoso quanto ao futuro, incerto sobre o antes, eu aia atravessando os fantasmas na medida em que a linguagem tornava inteligível a lição.
A palavra era minha poção, meu ungüento, minha cataplasma, meu fortificante. Nas manhãs, eram as palavras que os mais velhos me davam para vencer o dia, quando eu pedia a bênção e respondiam: “Deus te abençoe”. As palavras me acompanhavam, ao ouvir, quando de saída, um “vai com Deus”. Elas eram o meu presente quando me desejavam “felicidades”; eram a minha tristeza quando me via obrigado a dizer “até a volta”. As palavras me acariciavam, me ameaçavam o inferno, me libertavam do pecado, me abriam o céu, quando as histórias eram de santos, milagres, levitações. As palavras me roubavam o sono e construíam os sonhos, me aproximava das perdas ou inauguravam os meus lutos. E meu cuidado para com elas, era tanto, que o silêncio passou a ser o lugar onde todas dormiam. Para acordá-las era preciso muita cautela.
E se demais a solidão, eu pedia à minha avó uma história. Ela me assentava sobre seus joelhos – Sant’Ana sem livro – olhava o fundo da paisagem e arrancava um conto. Às vezes, eu não escutava. Sua presença era a minha leitura. Seu corpo perto do meu, sua voz era um pretexto. Sei que nessa hora de “porquês” eu me fazia sua leitura e nosso amor era nossa história.
E minha avó me contava a história do pescador que fisgava um baú de moedas e viveu feliz em saber que eram falsas, mas nem por isso menos belas. Ela falava, ainda vejo os seus olhos, para si mesma, reinventando o livro para bem suportá-lo. Eu testemunhava sua leitura, sua aflição, seus fracassos na medida em que legendava o seu livro sem texto. Então, as suas palavras me levavam para muito mais longe. Assim, diante dos limites, a liberdade nos visitava ao apelidarmos o real.
Bruxas, reis, madrastas, anjos e assombrações, afogamentos e encantamentos contidos nas histórias me revelavam o livro. Decifrá-lo deixou de ser meu desejo. Suas tantas leituras me fascinavam. A incapacidade de esgotar em enunciados e nuances do universo, passou a ser a minha maneira de conhecer. E se muitas histórias eu ouvia, mais o livro ganhava em profundidade, entendimento e mistério.
As histórias me aproximam das palavras escritas. Saber ler passou a ser ganhar outras portas, encontrar novos alicerces, desequilibrar o sabido, desconfiar da permanência. Ler era o que de melhor eu podia fazer por mim. Ler, não para saber, mas pelo prazer de receber notícias de outras inquietações.
Se visito o passado, não sei se as dúvidas das crianças hoje são outras. Às vezes sou levado a perceber que o mistério do nascimento e da morte, com suas inquietações intermediárias, persistem. Vejo então, como indispensável, tomar as crianças no colo e dizer da fragilidade da viagem, lançando mão dos mais eficaz dos métodos: deixar a fantasia ler o mundo e legendá-lo, então, afetivamente.
                     
Chega mais perto e contempla as palavras

cada uma
            tem mil faces secretas sob a face neutra
            e te pergunta,sem interesse pela resposta,
            pobre ou terrível, que lhes deres
            trouxeste a chave?
              

( Carlos Drummond de Andrade 
in “A Rosa do Povo” )

- PARABÉNS PARA NÓS PROFESSORES ! -

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

A ESFINGE CARIOCA.


A escritura do passado
Encontra-se em seus lábios selados
E quem sabe um dia
tudo nos será revelado.



 A mais popular esfinge brasileira é a Pedra da Gávea, localizada no Rio de Janeiro, na Baía de Guanabara. No alto de uma montanha granítica, está um ser, cujo corpo bovino ostenta uma colossal cabeça humana. Alguns acreditam que seja uma formação natural, outros acham que é obra de seres humanos em tempo remoto.
No século passado encontrou-se nas paredes da montanha uma série de riscos que alguns estudiosos interpretaram como uma antiga inscrição. Alguns atribuiram-na aos fenícios, povos navegantes do Mediterrâneo, que acidentalmente chegaram às costas do Brasil antes que Pedro Álvares Cabral.Mas há quem diga, que as inscrições fenícias vistas na Pedra da Gávea, não passam de fantasia delirante e é uma tentativa de tradução das nervuras da pedra.

Uma lenda indígena conta que o gigante da Pedra da Guanabara foi, em tempos remotos, um índio que assassinou uma jovem índia. Como castigo, Nhanderú o transformou em pedra e o obrigou a vigiar a Baía. Alguns pescadores afirmam que, às vezes, levanta-se e vai passear. Para tal empreendimento, chama as nuvens e cobre os morros para ninguém notar a sua ausência.
Outras lendas falam que no seu interior está a tumba de um grande soberano indígena, cercado de ricos pertences. O cacique teria sido enterrado junto com seus súditos mais próximos, sacrificados ritualmente.
Os tamaios chamavam a Pedra da Gávea de “Metaracanga”, que significa “cabeça coroada”. Nas suas cercanias ou no topo muitas pessoas já sumiram de forma misteriosa.
Também luzes estranhas, semelhantes ao fenômeno da “Mãe de fogo”, até hoje são vistas neste local e observados há muito tempo, pelos moradores das casas localizadas nos flancos da montanha.
Dizem que todos aqueles que tentam desvendar seus mistérios são vítimas de alguma maldição: a esfinge esconde muito bem os seus segredos.

(http://www.rosanevolpatto.trd.br/)

domingo, 11 de outubro de 2009

ÊVÉM O CHIBAMBA,NENÉM. ELE PAPA MININO, CALA A BOCA !

O Chibamba vem lá do sul de Minas Gerais assombrar as crianças malcriadas e teimosas que fazem manha na hora de dormir.
 Eu ouvi dizer que o Chibamba é o espírito das bananeiras, que ronca como um porco do mato e adora dançar.
Ele anda por ai somente a noite, envolto em uma longa esteira de folhas de bananeira, dançando de forma compassada enquanto caminha a procura de choro de criança teimosa.
Só sei que com o Chibamba a criança dorme até  mesmo sem sono.
Existe até uma quadrinha que diz:

- "Êvém o Chibamba, neném.  Ele papa minino, cala a boca !".

O nome "chibamba" deriva do  vocábulo africano  Bantu e teria como significado uma espécie de canto ou dança africana a exemplo do Lundu ( dança nativa africana).
Em Angola e Congo ainda os negros, em suas tradições festivas, dançam vestindo elaboradas roupas feitas de folhas, ramos e galhinhos de plantas locais.
 Sua chegada ao Brasil mineiro, em seus terreiros  onde as amas pretas de leite cuidavam dos seus bebês e também das crianças brancas: daí o surgimento do Chibamba como criatura assustadora e pavorosa.

Na tradição africana, os figurantes cobertos de folhas e mascarados  simbolizavam a encarnação dos seus antepassados,  que ora visitavam seus descendentes para abençoar suas festas, caçadas, colheitas, guerras e mesmo rituais de casamento.
Também os nossos índios dançavam envoltos em folhas e tecidos vegetais. Não é uma tradição dos Tupis, mas entre os pajés do Brasil colônia.
Esses nativos dançavam nas horas dos rituais religiosos, disfarçados, cobertos de folhas e pintados com corantes vegetais.

sábado, 10 de outubro de 2009

O MILAGRE DE SÃO BENEDITO.


A igreja do Rosário construída por Chico Rei e sua gente no cimo da encosta, em Ouro Preto, é singela e o seu interior pode ser chamado de humilde.
O altar-mor, em estilo barroco, ornado de volutas e flores estilizadas, o púlpitos bem talhados, a Via-Sacra em água-forte, os altares laterais obedecendo à forma comum das colunas torcidas com folhagens e anjos, solicita logo à entrada a admiração do visitante.

Das imagens que lá são veneradas, a mais curiosa é a de São Benedito, o santo negro que professou num convento da Sicília.
Ninguém deixa de notar que ele exibe um tufo de rosas nas dobras do burel. Esse particular está ligado à uma lenda que corre mundo.
E explica a forma inédita por que ali foi representado o milagroso franciscano.

O humilde frade era despenseiro do convento. Mas, como bom franciscano, confundia a despensa dos seus irmãos com a sacola dos esfomeados que vinham pedinchar diante da porta da casa de Deus.
 Não sabia dizer não. Ficava aflito sempre que ouvia um pobrezinho de Cristo dizer que ainda não tinha comido um bocado de pão.
Por isso, costumava desencaminhar o melhor da despensa para acudir à fome dos deserdados da terra.

Mas à hora das refeições, os frades, coitados, só encontravam à mesa o caldinho ralo, as folhas de hortaliça e os bocados de pão de rala.
Por causa disso, passaram a reprovar a conduta do frade. E o superior, zeloso da boa ordem conventual, teve de chamar à sua presença o negro, aconselhando-o a moderar um pouco os excessos da sua caridade, sob pena de matar de fraqueza os santos religiosos…

Ele, porém, por mais que se esforçasse, não conseguia mudar de conduta. Sempre que podia, apanhava alguns comestíveis, metia-os nas dobras do burel e lá ia, disfarçadamente, levá-los aos mortos de fome. Mas aconteceu que numa dessas escapulidas, no comprido e umbroso corredor do convento, encontrou-se com o superior.
 Sentiu-se surpreendido em pecado e não soube o que fazer.

- Que levas aí, na dobra do teu manto, irmão Benedito?

- Rosas, meu senhor.

– Ah! Mostra… Quero ver de que qualidade são!

Benedito, confuso, trêmulo, desdobrou o burel franciscano. E, em lugar dos alimentos suspeitados, apresentou aos olhos pasmos do superior uma braçada de rosas.

VERDADE !

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

E ASSIM O CÉU FOI CRIADO.



Na mitologia Tupi, é o deus do amor e do afeto.
Vive nas nuvens e sua função é despertar o amor dentro do coração dos homens. 
No começo havia a escuridão. Então nasceu o sol, Guaraci.
Um dia ele ficou cansado e precisou dormir. Quando fechou os olhos tudo ficou escuro.
Para iluminar a escuridão enquanto dormia, ele criou a lua- Jaci - tão bonita que imediatamente apaixonou-se por ela.
Mas, quando o sol abria os olhos para admirar a lua, tudo se iluminava e ela desaparecia.
Guaraci criou então o amor - Rudá - seu mensageiro, que não conhecia luz ou escuridão.
Dia e noite, Rudá podia dizer à lua o quanto o sol era apaixonado por ela. Guaraci criou também muitas estrelas, seus irmãos, para que fizessem companhia a Jaci enquanto ele dormia.
Assim nasceu o céu e todas as coisas que vivem lá.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O NEGRINHO DO PASTOREIO.


    Era uma vez um fazendeiro muito, mas muito rico mesmo. Quando resolvia contar dinheiro, as fazendas, o gado, as casas, o ouro e a prata que possuía, ficava todo embaralhado e nunca chegava a um resultado certo. E você sabe no que ele era também muito, mas muito rico mesmo? Em ruindade! Era danado de ruim e tratava todo mundo com o maior desprezo. Por isso, quando precisava de algum serviço, tinha a maior dificuldade para encontrar quem se dispusesse a atendê-lo.
    Sua atenção ia toda era para o filho – um boa-vida ruim que nem o pai -, para um cavalo baio que era a sua paixão, e para um escravo ainda garoto e muito bonitinho. Só que no caso deste último, a atenção era para judiar  dele o quanto podia. O pequeno escravo não tinha pai, nem mãe, nem um nome decente. Dizia que era afilhado de Nossa Senhora e todos lhe chamavam de Negrinho. Sua função na fazenda era cuidar dos cavalos, e – ai, ai, ai! – se alguma coisa acontecesse a um dos animais, sabia que seria punido sem misericórdia. Mas o Negrinho era muito cuidadoso e o fazendeiro não tinha motivos para castigá-lo. Além disso, aprendera a cavalgar como ninguém em toda imensidão da campina, o que fazia o fazendeiro malvado se sentir orgulhoso perante os demais.
    Um dia, o homem ruim conversava com o fazendeiro seu vizinho, um homem de bom coração. Conversa de cá, conversa de lá,  o homem ruim elogiava o seu baio, o vizinho elogiava o seu  cavalo mouro, que também era sua paixão, e resolveram apostar uma corrida de cavalos.
    - O dinheiro da aposta será para os pobres... – disse o vizinho.
    - Nada disso! Será para quem ganhar a corrida! – respondeu o homem ruim,           convencido de que seu baio sairia vencedor.
    E assim ficou o trato. Preparado o cavalo baio e o cavalo mouro, os cavaleiros montaram foi dado o tiro de largada, e – vupt! – o baio saiu disparado na frente.
    A vitória estava certa. Porém, quase na linha de chegada, o baio se assustou, empinou o corpo nas patas traseiras, rodou para a esquerda, rodou para a direita e – pum! – caiu o cavalo e o Negrinho junto com ele. Aí, o mouro passou á frente e cruzou a linha de chegada em primeiro lugar.
    O homem ruim ficou verde de raiva! Jogou o dinheiro pelos ares para cima do vizinho e voltou para casa, apressado. O Negrinho chorava baixinho:
    - Desta vez ele me mata! Oh, minha Nossa Senhora, desta vez ele me mata!.
    Não deu outra: o fazendeiro amarrou o moleque no tronco, deu-lhe uma surra e obrigou-o a ficar no pastoreio durante trinta dias, cuidando de trinta cavalos.
    O Negrinho ficou. Os dias passavam, os cavalos pastoreavam e nada de anormal acontecia. O Negrinho estava cansado e teve até uma hora que adormeceu.
    O filho malvado do fazendeiro foi espiar como andavam as coisas, doido para pegar alguma falha do escravo. Quando viu que ele dormia, fez um barulho que assustou os cavalos e todos se dispersaram pela campina.
    O Negrinho acordou com o barulho do tropel e ficou desesperado. Correu, chamou, gritou, mas os cavalos sumiram cada um para um lado. O filho ruim do homem ruim foi correndo contar ao pai que os cavalos não estavam no pastoreio.
O fazendeiro voltou a amarrar o negrinho no tronco e deu-lhe outra surra. Coitadinho, como sofria! Depois mandou que fosse procurar a manada e só voltasse depois que tivesse reunido os trinta cavalos.
    Era uma noite escura, sem lua nem estrelas para iluminar os caminhos.O Negrinho foi para junto da imagem de Nossa senhora, pediu ajuda e pegou um toco de vela que ardia aos pés da Virgem, para poder enxergar alguma coisa. À medida que caminhava, a cera da vela pingava no chão e cada pingo se transformava em outra vela acesa. Em breve toda campina estava iluminada e clara como se fosse dia.
    Os cavalos começaram a aparecer e, em pouco tempo, a manada estava toda reunida de novo. O Negrinho agradeceu a Nossa Senhora e sentou-se encostado a uma árvore. Estava exausto.Aquilo fora demais. Sem querer adormeceu, e o filho do fazendeiro, que havia seguido o garoto escravo, mal o viu dormindo, disparou um tiro e voltou a dispersar os cavalos. Depois, como era de se esperar, foi correndo contar ao pai que os cavalos continuavam desaparecidos.
    Mais uma surra no tronco! O Negrinho tinha as costas em sangue, não agüentava mais. Chorando de desespero e de dor, chamou por sua madrinha, soltou um gemido e morreu...
    O homem ruim nem ligou para o corpo do menino. Jogou-o na boca de um formigueiro para que fosse devorado pelas formigas e foi embora assobiando, como se nada tivesse acontecido.
    Foi se deitar, mas estava tão curioso para ver como havia ficado o corpo do menino, que não conseguiu dormir. De madrugada, sem que ninguém percebesse, foi até o formigueiro. E o que seus olhos viram? O Negrinho em pé, sorrindo e sacudindo as formigas, e os trinta cavalos, calminhos, ali junto. E bem ao lado do escravo, quem estava? Nossa Senhora!
    O fazendeiro ficou sem fala e sem ação. Num instante, percebeu toda sua maldade e sentiu um enorme arrependimento. Ajoelhou-se junto ao escravo e pediu perdão. O Negrinho montou no seu cavalo baio e partiu em tropel com toda a manada, percorrendo o pastoreio.
    Ainda hoje, de vez em quando, o Negrinho  atravessa as campinas com sua manada, em busca de animais e objetos perdidos.
    Os gaúchos que perdem alguma coisa pedem ao Negrinho que ajude a encontrar. E ele acha, mas só entrega se o dono acender uma vela para Nossa Senhora, sua madrinha.
Eu como não sou besta, mantenho a minha  vela sempre sempre acesa.

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Essa é uma lenda típica da região sul. 
Encontramos algumas variações espalhadas pelo Brasil.



quarta-feira, 7 de outubro de 2009

E ASSIM NASCEU O BUMBA MEU BOI.


Pai Chico, dono de uma enorme fazenda, tinha paixão por gado. Seu rebanho era enorme, mas existia um boi muito especial que Pai Chico destinava maiores cuidados – chamava-se Mimoso. De tão apaixonado que era, designou um empregado, o Severino, só para cuidar de Mimoso e servi-lo do melhor.
Pai Chico confiava cegamente neste empregado.
Algum tempo depois, este empregado, cansado de viver sozinho, conheceu uma mulher, a Catirina, e enamorou-se por ela.
Não demorou muito e estavam casados. Logo, logo, engravidou e lá pelo sexto mês, a tal mulher amanheceu com um desejo: comer a língua de um boi; só que não era de qualquer boi, era a língua de Mimoso. Seu marido ficou escandalizado.
Argumentou, disse que não era assassino, mas a mulher insistia e acabou convencendo o marido dizendo que caso não satisfizesse seu desejo, a criança que estava esperando poderia nascer morta.Sendo assim, Severino arrancou a língua do boi para matar o tal desejo de sua esposa.
Só que no dia seguinte, Pai Chico estranhando a ausência de Mimoso no pasto, começou a pressionar Severino que, arrependido, acabou relatando o acontecido.        
O boi, quase morto, foi socorrido por um Pajé e disse que a vida de Mimoso dependia somente da fé do povo. Então, o povo cantou e rezou a noite toda e Mimoso finalmente se recuperou: foi uma festa !
Desde então, no dia da festa junina o povo festeja o Boi-Bumbá.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

SERÁ QUE VAI DAR MACACO ?

Como ontem foi o dia universal dos animais, vou contar um pouco sobre os bichos, aliás, o bicho - o "Jogo do Bicho". Esse jogo de azar começou pelos idos de 1892, mas somente em 03 de outubro de 1941 que foi considerado ilegal. O que era uma boa idéia no início, com o tempo tornou-se crime. A cultura brasileira está cheia de dicas para se fazer uma "fezinha" e os sonhos são os mais utilizados. Secular no Brasil, o” jogo do bicho” é extremamente popular em todas as regiões desse imenso país.
Bem, esse jogo surgiu no Brasil no início da República pelas mãos do Barão de Drummond, João Batista Viana Drummond. Naquela ocasião, o aristocrata decidiu fazer  uma campanha para conseguir reerguer o jardim zoológico de sua propriedade, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, que passava por sérias dificuldades.
Assim, o Barão listou os 25 animais existentes no espaço e lançou o jogo,  estipulando quatro números para cada bicho, formando as dezenas de 00 a 99. Esse critério é utilizado até hoje, só alguns bichos que mudaram.
Inaugurado em 4 de julho de 1892, a imprensa e a alta sociedade carioca festejaram a novidade criada pelo Barão, afim de atrair mais pessoas para o seu imenso  jardim.
" A empresa do Jardim Zoológico realizou ontem um magnífico passeio campestre ao seu importante estabelecimento, situado no pitoresco bairro de Vila Isabel.
Em bondes especiais dirigiram-se os convidados e representantes da imprensa àquele local e depois de visitarem o hotel, que se acha nas melhores condições, os jardins, as gaiolas em que se acham os animais e aves, tomaram parte em um lauto jantar, em mesa de mais de 60 talheres, presidida pelo digno diretor daquela empresa, o sr. barão de Drummond.
O primeiro brinde foi levantado pelo sr. Sérgio Ferreira ao sr. Barão de Drummond, que em seguida, com toda gentileza, brindou à imprensa, sendo correspondido pelo nosso representante. Trocaram-se ainda outros brindes, sendo o último ao sr. vice presidente da República.
Com meio de estabelecer a concorrência pública, tornando freqüentado e conhecido aquele estabelecimento que faz honra ao seu fundador, a empresa organizou um prêmio diário que consiste em tirar à sorte dentre 25 animais do jardim Zoológico o nome de um, que será encerrado em uma caixa de madeira às 7h da manhã e aberto às 5h da tarde, para ser exposto ao público. Cada portador de entrada com bilhete que tiver o animal figurado tem o prêmio de 20$. Realizou-se ontem o 1º sorteio, recaindo o prêmio do Avestruz, que deu uma recheiada poule 460$000.
A empresa tem em construção um grande salão especial para concertos, bailes públicos, e vai estabelecer no jardim jogos infantis e outros diversos para o público.
Ás 9h voltaram os convidados, pessoas de alta distinção, penhorados todos à gentileza do sr. Barão de Drummond e seus dignos auxiliares. Foi uma festa esplêndida".
("Jornal do Brasil", 4 de julho de 1892)

Tudo ia bem, até que os vigilantes da lei apontaram a ilegalidade do jogo, como mostra a correspondência entre delegados publicada por outro jornal carioca cerca de duas semanas depois da inauguração do "jogo do bicho".

"Ao Dr. 2º Delegado dirigiu ontem o Dr. Chefe de Polícia o seguinte ofício:

No empenho de procurar atrair concorrência de visitantes ao Jardim Zoológico, solicitou o seu diretor para certo recreio público licença, que lhe foi concedida pela polícia, em vista da feição disfarçadamente inocente que da simples primeira descrição do divertimento parecia se deduzir.
Entretanto, posta em prática essa diversão, se verifica que ela tem o alcance de verdadeiro jogo, manifestadamente proibido. Os bilhetes expostos à venda contêm a esperança puramente aleatória de um prêmio em dinheiro, e o portador do bilhete somente ganha o prêmio, se tem a felicidade de acertar com o nome a espécie do animal que está erguido no alto de um mastro.
Essa diversão, prejudicial aos interesses dos encantos,  que com a esperança enganadora de um  incerto lucro se deixam ingenuamente seduzir, é precisamente um verdadeiro jogo de azar, porque a perda e o ganho dependem exclusivamente do acaso e da sorte.
Como semelhante divertimento não pode por mais tempo ser tolerado, e conquanto maior fundamento quanto é certo que muitas queixas me têm sido dirigidas pelas pessoas lesadas, assim intimarei ao diretor do Jardim Zoológico para que suspenda imediatamente a continuação do aludido jogo, sob pena de ser processado na conformidade dos artigos 369 e 370 do código penal".
("O Tempo", 23 de julho de 1892)

Assim, nesse vai e vem, o "jogo do bicho" começou a funcionar no Brasil. E essa ambigüidade entre legalidade e ilegalidade, manteve-se por décadas, escapando dos muros do Jardim Zoológico para todo o Rio e depois para o Brasil.
Finalmente a Lei de Contravenções Penais, decreto-lei 3.688, de 3 de outubro de 1941, considerou efetivamente a proibição dos jogos de azar no Brasil, prevendo prisão, multa e fechamento do estabelecimento quando descoberta a prática do jogo do bicho.
No entanto, a proibição não inibiu a sua prática. Aliás, como podem impedir um jogo tão popular, dizendo que os jogos de azar são proibidos no Brasil, se a própria Caixa Econômica Federal ( do governo ), explora uma porção de outros jogos de azar? (raspadinhas, mega-sena,lotomania,quina, etc) 
Total incoerência.
Com o passar dos anos, os "chefes do bicho" - chamados bicheiros - começaram a tornar-se cada vez mais poderosos, com braços em agremiações de escolas populares, como as escolas de samba e na política, com o apoio indireto a políticos.

Quero deixar claro que sou contra a qualquer manifestação de jogos de azar, só contei essa história porque ela faz parte da à história do Rio de Janeiro.

Saudações Florestais !